De certeza que já leram/ouviram esta frase, certo? 1 Será que faz sentido?
Eu diria: sim e não.
Sim, no sentido de que muita gente acha perfeitamente normal passar-se 40 ou mais anos da vida a fazer algo que absolutamente destestamos, que nos stressa, nos afecta até fora do trabalho, nos causa cabelos brancos e problemas cardíacos, apenas porque é “seguro” e “há tanta gente que nem emprego tem”. E essas pessoas, apesar de detestarem o emprego que têm, não fazem nada para mudar isso — nem procuram alternativas (mesmo que seja a fazer o mesmo, há empresas e empresas…), nem fazem por adquirir novos skills, nem tentam mudar de área para uma coisa de que gostem mais (por exemplo, não é o meu caso, mas alguém extrovertido e sociável pode ser bem mais feliz a trabalhar num bar do que num escritório — mesmo que o ordenado seja no início menor). Somado a isto, em muitos casos (isto, pelo que sei, é menos comum hoje em dia do que “no meu tempo”, mas ainda existe) há pais e outros familiares a avisar-nos para escolhermos o curso, e posteriormente empregos, focando-nos somente na remuneração (inicial e potencial) e carreira, ignorando completamente a questão de gostarmos ou não disso. Por isso é, na minha opinião, do nosso interesse evitar trabalhos que detestemos e que nos façam mal, mesmo que isso implique ganhar um pouco menos. E é boa ideia procurar algo de que (pelo menos ocasionalmente) gostemos, e que nos permita ter (pelo menos de tempos a tempos) orgulho no que fazemos — mesmo que isso implique mudar de trabalho várias vezes, até encontrarmos algo decente.
Por outro lado, diria que não, em muitos casos, incluindo, de certa forma, o meu próprio. Isto porquê? Porque a frase assume que o que “adoramos”, o que nos faz felizes, há de ser necessariamente um trabalho, algo pelo qual um número suficiente de pessoas está disposto a pagar.
Mas nem sempre isso é assim. E se o que adoras é algo mais simples, como estar tardes num jardim a ler um livro (completamente ao teu ritmo — não, não daria para seres crítico literário)? Ou fazer caminhadas sozinho/a, cada dia num sítio diferente (não, não daria para seres guia/organizador)? Ou — o que é em grande parte o meu caso, se bem que os exemplos anteriores também não me desagradam) jogar videojogos (de forma relaxante e não competitiva, por isso não daria para seres jogador profissional e/ou streamer no YouTube)?
Em resumo, e se o que realmente adoras é paz e sossego? Quem é que te vai pagar para isso?
A resposta é “ninguém vai… e ninguém tem qualquer obrigação de o fazer“. Daí focar-me tanto na questão da independência financeira — é a única forma de um dia poder realmente fazer as coisas que me fazem feliz, sem ser um “parasita” para a sociedade. Um dia…
(Se realmente adoras fazer algo com o qual consegues ganhar a vida, algo que farias mesmo que não te pagassem para isso… fantástico; aproveita. 🙂 Eu, na adolescência, era suficientemente ingénuo para achar que a informática seria isso para mim… mas acabou por não ser o caso. Enfim, o universo não tem obrigação nenhuma de se adaptar a nós.)
Opiniões?
- Curiosamente, até hoje não se sabe quem é o autor — a frase até já foi atribuída a Confúcio, mas no local e altura em que ele viveu, salvo raras excepções, uma pessoa não escolhia a sua profissão, não havia praticamente nenhuma mobilidade nesse aspecto, logo a origem será quase de certeza bem mais recente.
Concordo! E deixa-me a pensar o que realmente quero para o futuro e se estou no local certo. Sei que o que faço eu gosto, mas será que quero isto até ao final da vida! NÃO! Quero aproveitar a vida entanto tiver as minhas capacidades físicas e mentais para usufruir da melhor maneira. Não é chegar a velha e começar a pensar que podia ter feito mais por mim.
Vamos “trabalhar” para a independência financeira e fazer o que realmente se gosta. 🙂
Um dia. 🙂
Concordo com todo o texto. E também acho que mesmo façamos algo que nos preencha, o ser humano nunca está satisfeito… Falta sempre alguma coisa. Tal como tu, estou na luta para a independência financeira. Digo, a brincar, aos 50 anos quero reformar, e é esse sonho que comanda a minha vida 🙂
Concordo com as visões abordadas no teu texto, mas ““Escolhe uma profissão a fazer algo que adores, e nunca vais ter de trabalhar um único dia na tua vida”, não é, mesmo, bem assim. Profissionalmente falando, eu gosto do que faço, mas a busca por conhecimento é constante (logo dá trabalho – se dá). Pessoalmente, adoro cinema e leitura, vou ver se da próxima vez que for a uma sala de cinema me dão o valor do bilhete ao envés de me o pedirem 😛
Frases feitas têm sempre um q de estupides.
Gostar do que se faz não lhe retiro o trabalho…
E acho que a frase se refere mesmo a trabalho profissional. Não a atividades que gostemos de fazer 🙂
Acho que a ideia é aquelas pessoas que têm uma “paixão louca” por algo, em que adoram tudo o que tenha a ver com isso. Por exemplo, um músico que esteja sempre com um instrumento na mão e/ou a cantar, uma pessoa super-extrovertida para quem trabalhar atrás de um bar nem seja “trabalho”, um mecânico que só esteja feliz a desmontar e montar motores… ou eu na adolescência em relação à informática. Em resumo, refere-se a alguém que consegue monetizar a sua paixão — seja a trabalhar para outros ou não –, já que a pessoa nem considera isso “trabalho”, mas sim lazer.
O implícito aqui — e por isso é que desconfio que a frase nasceu nos EUA, com a sua “ética protestante de trabalho”, e não no Oriente, ou na Europa, por exemplo — é que o que nos faz feliz devia ser o trabalho, ou, quando muito, um tipo de trabalho. Mas, claro, muita gente não é assim. Eu gosto em geral do meu trabalho, e sei que é dos que mais se adequa à minha personalidade (já que não posso ser um Indiana Jones ou coisa parecida 🙂 ), mas o que me realmente faz feliz são coisas para as quais ninguém pagaria — a tal “paz e sossego”, nas suas várias formas. Daí eu achar a frase um bocado ingénua (se bem que se se aplica a alguém, óptimo para essa pessoa!), e até um bocado imoral, já que uma possível implicação dela é que se não há um trabalho que nos faça felizes, então é como se houvesse algo de errado connosco, fôssemos uns preguiçosos que não queremos fazer nada, etc.
Enfim, estou a divagar um bocado. 🙂 Mantenho o que digo no post: é importante procurar um trabalho de que gostemos (o que pode implicar mudar várias vezes até se encontrar um), mas para a maior parte das pessoas não é viável — nem devemos exigir — encontrar-se algo que adoremos tanto que nem o consideremos “trabalho”, que até faríamos de borla, etc..